Ah! A moda é mesmo uma arte! E há quem veja essa cobertura da Semana de Moda de Paris 2022 como um simples reflexo de uma agenda cotidiana, mas é esse reflexo que nos mostra de forma poética (e talvez um pouco mercadológica também) a quantas anda o mundo. Sim, porque a moda, a música, o cinema, os quadros e as mais diversas formas de arte funcionam como um espelho social, nos mostrando todos os lados, a luz e a sombra, o positivo e o negativo, o bom e o ruim do mundo.

Por isso, tal qual foi o meu suspiro ao ver o título da matéria do estado de minas: “Como um espelho, a moda reflete a guerra nas passarelas de Paris”. Não foi uma surpresa, mas sim uma certeza. De saber que isso iria acontecer, porque se está acontecendo um evento em larga escala, é muito provável que ele vá se tornar uma das grandes inspirações de moda.
Sem muitas delongas filosóficas, eu já fazia algumas apostas para esse novo período de outono/inverno. Dentre elas, até me pergunto: seguirá mesmo a moda se baseando em uma divisão de duas estações? Vamos saber daqui um tempo! Enquanto ele não chega, já podemos citar algumas tendências que imaginei que retornariam ao nosso tempo:
- Calças cargos e largas já estão a todo vapor há umas semanas;
- Cores mais escuras, que são típicas do padrão de temporadas frias;
- Taxas, cintos, acessórios mais pesados – que marcam a nebulosidade dos desafios enfrentados pelo mundo;
- Referências a elementos militares, lembrando que o berço das Semana de Moda é a Europa, do ladinho da Guerra da Ucrânia;
- Cortes e estilos mais retos, pesados e sérios: um apelo ao que nos remete o universo “masculino”, ideia que já poderia cair por terra agora mesmo;
- Tecidos resistentes e de grande cobertura (quem não lembra que a calça jeans surgiu num cenário de guerra?);
- Algo que seja o oposto a tudo isso e represente sentimentos e leveza, como o neon e o brilho. Elementos de contraste, mas que conversam com todo o resto. O yin e o yang em todos os aspectos.
Depois das apostas, vamos ao que realmente subiu nas passarelas da Semana de Moda de Paris 2022


A Dior apostou num desfile disruptivo: saindo do New York Look para um visual cheio de tecnologia e traços de guerra. Começou com uma roupa fluorescente, trouxe a tecnologia da roupa “condicionada” e colocou airbags em espartilhos e coletes.
“Temos essa ideia de que a tecnologia é algo um pouco irreal”, afirmou a estilista Chiuri antes do show. “Usamos mais a tecnologia para comunicação e pensamos menos em como ela pode nos ajudar a viver melhor. Estamos acostumados a esperá-la em coisas muito práticas: máquinas de lavar, mas não moda.” Tecnologias essas bem projetadas para mulheres, resgatando o feminismo como um traço importante do conceito do desfile.


“Estamos bem cientes de que há coisas mais importantes acontecendo no mundo hoje. É difícil se sentir bem em focar em passarelas e roupas, enquanto ouvimos com o coração pesado as últimas notícias. Nossos pensamentos e orações estão com os ucranianos. Somos inspirados por sua dignidade, resiliência e devoção à liberdade”, confirmou o estilista Olivier Rousteing, da Balmain.
Apesar do visual pesado, inspirado realmente em cenários de guerra, equipamentos de automobilismo, armaduras antigas, militaria moderna e até nos curativos usados pelo estilista (após um trágico incêndio em sua casa), ele admitiu que a inspiração não foi imediata aos eventos atuais – e sim um resgate de uma Paris pós-guerra. Acertou mesmo sem querer.


Stella McCartney abriu o desfile com palavras do ex-presidente americano John F. Kennedy e finalizou com a música de John Lennon e Yoko Ono “Give Peace a Chance”. Segundo a estilista, foi difícil produzir um desfile enquanto o mundo debate a guerra, e era necessário lembrar isso. Trouxe apelos sustentáveis em diversas tecnologias que foram da roupas aos acessórios. Com uma tecnologia inovadora que transforma cascas de uva em couro simulado, ela explicou: “então, todo o vinho que você bebeu ´[durante a pandemia] foi transformado em uma bolsa”.
Uma passarela cheia de sentimentos
Podemos então, concluir, que a Semana de Moda em Paris Autumn/Winter 2022 nos reflete os acontecimentos recentes do mundo. Ela envolveu não somente o mundo físico, como também a ampla gama de sentimentos da população: o medo, a necessidade de proteção, a ansiedade, a esperança e a fé. Uma grande miscelânea aplicada em roupas, nuances, curvas e texturas. Essa grande arte que é a moda conceitual.